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Leandro Bernardes / PxImages

Entrevistas

Irmãos Nogueira destacam ética de trabalho e elegem Anderson como maior da história

Uma semana após sofrer com a aposentadoria precoce de Khabib Nurmagomedov, os fãs do MMA podem passar por mais uma perda neste sábado (31), ao final do UFC Las Vegas 12. Escalado para enfrentar Uriah Hall na luta principal do evento, Anderson Silva deve fazer o último combate de sua brilhante carreira, ao que tudo leva a crer. Ex-campeão peso-médio (84 kg) do Ultimate, o ‘Spider’ – considerado por grande parte da comunidade das lutas como um dos maiores atletas na história do esporte – se notabilizou pela habilidade, plasticidade nos golpes, força mental, e pelo estilo de luta irreverente, mas nada foi por acaso.

Em conversas exclusivas com a reportagem da Ag Fight, as lendas do MMA brasileiro Rodrigo ‘Minotauro’ e Rogério ‘Minotouro’ – amigos pessoais e parceiros de treino de longa data do ex-campeão do UFC – fizeram questão de exaltar a ética de trabalho do ‘Spider’ nos treinamentos, que, segundo eles, além de explicar a origem de boa parte dos golpes geniais apresentados por Anderson durante toda sua carreira, serve como um dos principais legados deixados por ele para as futuras gerações.

Carreira e legado com os quais os irmãos Nogueira contribuíram de forma decisiva e significativa. Quando em um determinado momento de sua trajetória, em que Anderson deixou a equipe ‘Chute Boxe’, o mesmo cogitou abandonar o MMA, mas foi persuadido a continuar sua trajetória por ‘Minotauro’ e ‘Minotouro’, e foi acolhido pelos gêmeos na academia deles, a ‘Team Nogueira’.

“Ele, além de tudo, era um artista marcial. Para quem não sabe, ele é um cara que gostava muito da técnica, dos golpes, treinava bastante. Acho que o legado para o pessoal mais jovem é que para conseguir ter sucesso no que você faz, você tem que se dedicar. E isso ele faz hoje em dia na transição de carreira dele. Ele está estudando para ser ator, ele todos os dias levanta e vai para a escola (de atuação). Então, ele é um cara que sempre trabalhou muito duro. Esse é um legado que ele pode deixar para as pessoas que querem sucesso: acordem cedo e vão trabalhar. Isso ele fazia muito bem”, comentou Rodrigo ‘Minotauro’.

“O Anderson era muito psicopata com os treinos. Ele terminava o treino às vezes, na XGym ou na Team Nogueira, e começava a chutar. Ele terminava um treino de duas horas e ficava chutando, ficava mais uma hora treinando, sozinho às vezes. A pessoa pode achar que ele está fazendo isso para impressionar, para dizer que ele é o que treina mais, mas dentro da cabeça do campeão, ele quer fazer mais, não para os outros, ele quer fazer para ele. Porque ele busca a perfeição, ele só vai parar quando conseguir isso. As pessoas querem fazer por fazer, o campeão quer fazer o melhor. Ele não quer fazer meia boca, fazer só para constar. E o Anderson sempre teve isso”, destacou Rogério ‘Minotouro’.

Para ilustrar a importância que o foco nos treinamentos teve na carreira do companheiro, ‘Minotouro’ relembrou uma história que destaca também o rápido poder de aprendizado do ‘Spider’. De acordo com o ex-lutador, a defesa de queda, com reversão de posição, que deu início à vitória de Anderson sobre Nate Marquardt, em 2007, foi mostrada por ele e por Rafael ‘Feijão’ – companheiro de equipe de ambos – restando apenas uma semana para o combate.

“Uma vez eu voltei dos Estados Unidos e mostrei uma queda para o (Rafael) Feijão. Era uma inversão. Quando o cara vai na sua perna no single leg, você vai na segunda perna dele, puxa e o adversário meio que cai de cara no chão. Eu mostrei para o Feijão e ele mostrou para o Anderson, sem pretensão. E o Anderson ia lutar na outra semana contra um americano casca-grossa (Nate Marquardt)”, contou Rogério, antes de continuar.

“O cara meteu o single leg (na luta), o Anderson foi e usou essa posição que ele tinha treinado com a gente uma semana antes. Ele puxou na segunda perna, o cara caiu de cara no chão, ele foi para o ground and pound e acabou com a luta. O campeão arrisca, ele tira do nada, você ensina uma coisa para ele hoje e amanhã ele já está fazendo. Ele se apropria daquilo e cria muita coisa também, porque ele é ousado. Ele não faz o tradicional, faz o diferente, o que o adversário não espera. O campeão tem coragem, tem atitude, sobe na hora da pressão. Essa é a diferença. E o Anderson tem isso: fisicamente, tecnicamente e mentalmente muito completo”, afirmou.

Quanto ao lugar ocupado pelo ex-campeão peso-médio do UFC no panteão dos maiores lutadores de todos os tempos, os irmãos Nogueira não têm dúvidas: Anderson é o número um. Tanto Rodrigo como Rogério ressaltaram que as conquistas e a importância do ‘Spider’ para o MMA se equivalem a de outros ídolos indiscutíveis em outros esportes, como Pelé, Ayrton Senna, Gustavo Kuerten, o ‘Guga’, e Michael Jordan.

“No legado esportivo, eu acho que ele é o Pelé. Eu acho que dá para a gente comparar bem o que o Pelé fez no futebol e o que o Anderson fez para o nosso esporte. O Anderson é o que o Michael Jordan foi no basquete, o que o Guga foi no tênis. Ele teve essa importância para o MMA, não só nacional, (mas) mundial, para o esporte. Porque o UFC, quando teve aquela visibilidade (no Brasil) em 2008 ou 2007 até 2013, foram oito anos aí de legado, com golpes diferenciados, nocautes, toda uma história que foi contada na vida dele. O cara é um ícone, aquele jeitão dele. A comemoração dele é diferente, até a dancinha dele é diferente, a encarada dele fez história, então, em todos os sentidos, acho que ele vai se tornar um ícone do esporte”, declarou ‘Minotauro’.

“O sentimento é de que ele deixou um legado muito grande no esporte. Se fosse comparar, eu comparo o Anderson Silva com o Pelé, o Ayrton Senna, o Guga. O brasileiro precisa de um campeão, de um ídolo. E o Anderson é, há muito tempo, um ídolo do Brasil no esporte. Ele foi um cara diferente. Eu o coloco como o melhor de todos os tempos. Ele sempre foi muito respeitador com as palavras, e, ao mesmo tempo, muito ousado dentro do octógono. Respeitador nas entrevistas, não fazia o trash talk, mas dentro do ringue, ele era irreverente, tirava onda, abaixava a guarda, ele fazia com que seu adversário se sentisse um faixa-branca na frente dele. Foi um cara que dominou a categoria por quase dez anos, se não me engano oito anos. Em uma categoria que era uma das mais disputadas do UFC. Ele ganhou de grandes nomes. Eu acho que o UFC nunca teve um campeão tão absoluto como ele. Não só no domínio, mas no estilo também. Esse cara realmente vai deixar saudade, já está deixando saudade. E ele marcou de verdade. Para mim, existe o UFC antes do Anderson e depois do Anderson”, sentenciou ‘Minotouro’.

No MMA profissional desde 1997, Anderson Silva, de 45 anos, soma 34 vitórias, sendo 22 por nocaute, dez derrotas e um ‘no contest’ (luta sem resultado) em sua carreira. Uma das maiores lendas do esporte, o brasileiro reinou soberano na divisão dos pesos-médios do UFC entre os anos de 2006 e 2013. Contra o jamaicano Uriah Hall, neste sábado, pela luta principal do UFC Las Vegas 12, o ‘Spider’ deve se despedir dos fãs e encerrar a laureada carreira.

Nascido em Niterói (RJ), Neri Fung é jornalista e apaixonado por esportes desde a infância. Começou a acompanhar o MMA e o mundo das lutas no final dos anos 90 e começo dos anos 2000, especialmente com a ascensão do evento japonês PRIDE.

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