Entrevistas

‘Minotauro’ relembra drama para fazer luta mais importante da carreira no UFC Rio 1

Depois de tantos anos dedicados ao MMA, o nome de Antônio Rodrigo Nogueira passou a carregar o significado de superação. ‘Minotauro’ marcou época tanto no Pride FC como no UFC, onde venceu lutas importantes, conquistou títulos e, ao mesmo tempo, sofreu com inúmeras lesões em sua carreira. E um dos episódios mais dramáticos desta trajetória aconteceu na preparação para o UFC Rio 1, show realizado no dia 27 de agosto de 2011, no retorno da organização ao Brasil.

Em entrevista exclusiva à reportagem da Ag. Fight, ‘Minotauro’ relembrou a experiência de atuar neste card – quando, para isso acontecer, ele foi obrigado a ultrapassar seus limites. Na ocasião, a organização definiu que Rodrigo, já veterano do esporte, enfrentaria Brendan Schaub, promessa do peso-pesado. Se a diferença de idade era evidente, a comparação entre eles ficou ainda mais complicada graças à condição física do veterano.

Após perder para Cain Velasquez na eliminatória para disputar o cinturão do peso-pesado do UFC, em fevereiro de 2010, ‘Minotauro’ passou por uma cirurgia no joelho e no quadril, ou seja, apresentava dificuldades para completar uma simples caminhada. Sem movimentação, o brasileiro se tornaria um alvo fácil para os adversários, porém, mesmo com o prognóstico ruim, ele não desistiu.

“Quando recebi o convite para lutar no UFC Rio 1, eu não tinha condição alguma. Eu tinha operado o ligamento cruzado anterior do joelho, o quadril do lado esquerdo. Fui chamado em fevereiro para lutar em agosto. Tirei a muleta três meses antes da luta. Foi difícil, estava muito machucado. Foi uma lesão seríssima nos dois quadris. Quando conheci a fisioterapeuta Ângela Côrtes, que foi importantíssima no tratamento, eu estava na clínica dela, justamente, marcando para começar a fisioterapia. Recebi a ligação do pessoal querendo que eu lutasse no evento, mas não conseguia botar o pé no chão, ainda iria operar a outra perna”, declarou a lenda do MMA, antes de completar.

“Como poderia aceitar o desafio de lutar no Brasil? Mas aceitei. Era o momento do Brasil. Para mim, seria um desafio lutar naquele card e consegui pela fisioterapia, junto com a Ângela. Foram meses de tratamento, 760 horas de fisioterapia até conseguir voltar a treinar quase três meses antes da luta. Em um tempo normal, seriam dois anos, fazendo uma hora por dia. Eu fiz seis horas de fisioterapia por dia. Na coletiva de imprensa no Copacabana Palace, eu estava de muleta. Foi um desafio grande. Essa não foi uma luta de título, mas, para mim, foi a mais importante, porque não foi com um propósito para mim e sim para o esporte”, contou o embaixador do UFC no Brasil.

Formada em Fisioterapia desde 1995, Ângela Côrtes tem como especialidade trabalhos de prevenção de lesões em atletas amadores e de alta performance e foi a principal responsável pela reabilitação de ‘Minotauro’. Sem a profissional, dificilmente a lenda do MMA atuaria no UFC Rio 1. No entanto, o início da relação entre eles foi conturbada e muito por conta da descrença do lutador em relação ao momento de fragilidade que atravessava.

Após tomar conhecimento do quadro clínico de ‘Minotauro’, a fisioterapeuta revelou, também em entrevista exclusiva à reportagem da Ag. Fight, que achou algo estranho no processo de recuperação do atleta e entrou em cena. Desde o começo, a profissional abordou a relação com seu paciente de forma franca e expôs que o processo de reabilitação exigiria muito do lutador, mas que, ao mesmo tempo, era possível a lenda do MMA atuar no Brasil pela primeira vez em sua carreira. Inclusive, a especialista revelou que tal observação pontual chocou Rodrigo, mas lhe deu motivação para transformar o quase milagre em realidade.

Acervo pessoal

“Entre o Natal e o Ano Novo, me ligam dizendo que estão com um atleta de MMA, que fez cirurgia no quadril esquerdo e que estava se recuperando no centro olímpico de San Diego, mas que não estava sentindo resultado e que iria para o Brasil. Achei estranho que, em três semanas, ele não colocava o pé no chão. Vi que ele não acreditava nele mesmo e que as pessoas ao redor dele não acreditavam mais. Depois da avaliação, perguntei o que ele queria e ele falou que não conseguia mais, só coisas negativas. Perguntei novamente e ele respondeu que o sonho dele era voltar a lutar. Fomos trabalhando e ele começou a acreditar no meu trabalho e eu na recuperação dele. Ele me contou que o UFC ia para o Rio e eu perguntei se ele queria lutar. Ele olhou e disse: ‘Como eu vou lutar? É em agosto’. Ele disse que nunca tinha lutado no Rio e eu falei que isso poderia ser um sinal. No primeiro UFC no Rio, ele tinha que lutar, os fãs queriam vê-lo. Ele não acreditava, mas falei que poderia aceitar”, relatou a profissional.

Para a luta contra Schaub, no UFC Rio 1, ‘Minotauro’ foi classificado pelas casas de apostas como ‘zebra’, mesmo atuando em seu país natal. Além disso, em caso de derrota, a imprensa especializada especulou que a lenda do MMA poderia aproveitar o cenário para anunciar sua aposentadoria. Como o quadro já era desfavorável antes mesmo do duelo contra o americano ser anunciado, devido a gravidade de sua lesão, Rodrigo ignorou as estatísticas.

É bem verdade que ‘Minotauro’ admitiu que a batalha seria crucial para seu futuro, mas ressaltou que superar adversidades é sua especialidade, ainda mais quando as chances de sucesso são bem reduzidas. De acordo com a lenda do MMA, todo sacrifício feito para atuar no UFC Rio 1 valeu a pena, mas ele também fez questão de ressaltar que o carinho e incentivo do público foram cruciais em sua vitória por nocaute no primeiro round. O orgulho de Rodrigo é tanto, que o mesmo classifica essa luta como a mais importante de sua carreira.

Eduardo Ferreira

“O atleta fica um pouco mais sensível no momento que perde uma luta, que vem de lesão. Aquilo tudo mexeu comigo. Foi uma emoção total, eu quase entrei chorando. O Schaub era favorito e eu estava vindo de três cirurgias. Não achei um desrespeito ele ser favorito. Ele era uma revelação do UFC. Mas sempre me destaquei nas grandes lutas, nos desafios mais duros. Se eu tivesse perdido, eu poderia parar, com certeza. Foi uma decisão para mim. Eu não sabia como seria meu comportamento na luta, mas fui bem. Foi sensacional o clima, a imprensa brasileira apoiando, o grito ensurdecedor da torcida. Não tinha como dar errado. Essa foi a luta mais importante para mim, mesmo sem valer um título”, destacou ‘Minotauro’.

Ângela Côrtes fez das palavras de Rodrigo as suas e complementou. A fisioterapia lembrou que não só a carreira de ‘Minotauro’ é feita de superação, como também sua história de vida e mencionou o trágico episódio que aconteceu na infância do mesmo, que lhe deu o famoso apelido. Apesar da descrença de parte da comunidade do MMA na recuperação do brasileiro, a profissional afirmou que nunca teve dúvida de que ele conseguiria dar a volta por cima. Após a difícil experiência, a especialista se mostrou grata por ter a confiança de um ícone do esporte em seu trabalho e não escondeu o orgulho por ter ajudado o amigo.

“Todos achavam que ele fosse se aposentar, mas ele tem uma coisa diferente dentro dele. Rodrigo é superação, a marca registrada dele é superação. A resiliência dele, ele conseguir se reinventar é impressionante. Talvez pela história de vida, por ter sido atropelado por um caminhão, ter ficado em estado grave. A gente sabia o que estava fazendo e sentia nele a vontade. Foi maravilhoso. Foi muito trabalho. Ver a felicidade dele quando ganhou, aquele alívio. Veio a história toda na cabeça. Ninguém acreditava. Ele falava isso e eu fiz acreditar. Ele é coração, é diferenciado. Ele entrou para provar para ele que ia conseguir”, concluiu a especialista.

O nocaute aplicado por Rodrigo ‘Minotauro’ em Brendan Schaub levou o público presente na HSBC Arena ao delírio. Além de chocar o mundo ao superar a promessa americana no primeiro round, o veterano ainda faturou o bônus de nocaute da noite do UFC Rio 1, ou seja, a premiação foi uma espécie de presente por toda trajetória sofrida até o momento de redenção.

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