Começo, apelido e estreia: primeiro treinador relata ‘nascimento’ de Amanda Nunes
Neste sábado (6), Amanda Nunes pode fazer ainda mais história no Ultimate. A baiana defende pela primeira vez o cinturão peso-pena (66 kg), diante de Felicia Spencer, e pode ser a primeira lutadora da história da organização a defender dois cinturões de forma simultânea – ela também possui o título do peso-galo (61 kg). Mas quem vê o sucesso da brasileira agora não imagina as adversidades pelas quais ela passou até chegar nesse patamar. Por isso, nada melhor do que seu primeiro treinador e incentivador no esporte, Ricardo Carvalho, em entrevista exclusiva à reportagem da Ag.Fight, para relatar os primeiros passos da ‘Leoa’ nas artes marciais, a origem de seu apelido e o pontapé inicial para sua escalada até o topo do MMA no mundo.
Com apenas 16 anos, Amanda Nunes teve a oportunidade de treinar em uma academia renomada em Salvador (BA). Com incentivo de sua irmã, Vanessa, a lutadora foi levada para conhecer as instalações da academia Edson Carvalho. No local, conheceu Ricardo, que foi seu mestre no jiu-jitsu e judô – uma vez que ele gostava de ensinar duas modalidades aos seus alunos. Como na época morava em Pojuca (BA), e não tinha condições financeiras de fazer essa viagem, que dura cerca de 1h40, a atleta decidiu morar no local.
“Ela morava num bairro distante da academia, no Porto da Barra e tinha um custo de ir e voltar. Depois ela foi pegando uma amizade com o pessoal. Foi devido isso que ela foi morar na equipe. Por conta da distância e por conta do custo. A gente ajudava como podia, mas não tínhamos muito. (…) Nossa academia é uma espécie de academia com alojamento. Outros atletas já moravam lá. Ela se adaptou, ela é disciplinada, muito dedicada. Ela gostava de treinar. Ela começou com jiu-jitsu, judô, depois karatê também e kickboxing. Comigo fazia judô, jiu-jitsu e condicionamento físico. Era saudável e muito alegre o dia a dia com ela”, revelou o treinador.
Com a disciplina e foco, Amanda começou a se destacar nos campeonatos de jiu-jitsu em que participava. Na carreira na arte suave, a lutadora conquistou medalhas, venceu o campeonato Panamericano e o Mundial da modalidade. Com esse sucesso na arte suave, o mestre Ricardo Carvalho teve a ideia de dar o apelido que a lutadora carrega até hoje e é sua marca registrada.
“Nosso símbolo são dois leões, da nossa logomarca. Recebi um cartaz da África, que um leão nunca dá as costas para o outro. Também tinha uma outra foto, um leão na frente do outro, o que significava que um confiava no outro. Aí lançamos o símbolo. Como dois leões, nada melhor que uma leoa também. Então nasceu a história da ‘Leoa’. A ‘Leoa’ entre os leões. Aí virou Leoa dos ringues e deu certo, graças a Deus”, disse.
Se o rugido de Amanda já fazia barulho nos tatames em competições pelo Brasil e mundo, chegava cada vez mais perto o momento da lutadora se aventurar no seu grande sonho: o MMA. Apesar da equipe só ter homens praticando a modalidade, a atleta não se intimidou e se colocou entre eles, mostrando todo seu talento. Atento às suas performances, Ricardo foi o grande incentivador para ela fazer sua primeira luta, em 2008, contra Ana Maria ‘Índia’, no show Prime MMA 2, evento que aconteceu em Salvador
“Nosso treinamento sempre teve essa parte de Vale-Tudo, porque sempre fez parte da nossa história. Já tinha levado muitos lutadores para participar e a Amanda ia junto. Ela tinha vontade de participar, de lutar MMA. Teve todo nosso apoio, se ela queria treinar, participar. E foi nesse momento que começou a história de mulheres no MMA. Ela foi se preparando e chegou a estrear aqui. Ela não estava muito preparada, mas tinha muita disposição e queria se jogar nisso. Ela lutou com a ‘Índia’. Na época ela quase nocauteou, mas como a rival era faixa-preta, pegou o braço dela. Mas depois disso acendeu mais o fogo dela pelo MMA e treinou mais ainda. Decidiu que era isso que queria mesmo. A gente via muito potencial, porque por causa da dedicação e ela gostava muito. A gente imaginava que fosse crescer, era uma tendência no mundo o MMA crescer”, contou.
Apesar da derrota na estreia, Amanda não se abateu e seguiu sua carreira nos ringues pelo Brasil, somando cinco vitórias seguidas e se colocando como um nome promissor no esporte. Foi nesse momento que o irmão de Ricardo, Edson Carvalho, decidiu dar um novo rumo para a baiana e levá-la para os Estados Unidos, com a meta de já colocá-la no Strikeforce, extinto evento que valorizava o MMA feminino na época.
“Depois que ela fez umas lutas aqui no Brasil, o Edson, que já morava nos Estados Unidos, veio aqui e olhou o potencial nela. Nessa ele perguntou se ela queria ir para os Estados Unidos e ela respondeu que sim. Ele preparou tudo de visto, documentação e entrou em contato com o Strikeforce para levá-la. Ele passou um tempo com ele lá nos Estados Unidos, treinou com ele e lançou ela. E em 14 segundos nocauteou a Julia Budd e dai para frente foi só alegria”, comemorou Ricardo.
Ao ver todo o sucesso e o status que Amanda Nunes alcançou na carreira e dentro do UFC, Ricardo Carvalho não esconde o orgulho de ter sido seu primeiro treinador e que a incentivou no esporte. Segundo o baiano, o domínio de sua pupila, que não sabe o que é uma derrota desde 2014, ainda pode durar muito mais.
“Para a gente que plantou essa semente, regou e colheu frutos, é um motivo de muito orgulho e sinal que estamos no caminho certo. É uma satisfação grande, a melhor lutadora do mundo ter saído daqui e dando continuidade ao crescimento. É que nem filho, cresce para o mundo e estamos muito felizes com o sucesso dela.Com a estrutura e base que ela tem, tem capacidade de manter por muito tempo esse domínio. Ela tem condição boa de treinamento. Se mantiver o treino, condicionamento. Às vezes o glamour tira um pouco o foco do atleta, do ritmo. Se tive a disciplina de manter o treino, dá para manter por muito tempo. Vencendo adversárias duras, como a ‘Cyborg’, que estava há dez anos sem perder. Então tem tudo para dominar o MMA. Mas acho que ela estava querendo dar uma descansada e é bom parar no auge, né?!”, finalizou.
Campeã peso-galo e peso-pena do UFC, Amanda fará a primeira defesa de título na categoria até 66 kg neste sábado (6), diante de Felicia Spencer. A baiana conquistou o cinturão da divisão ao nocautear a compatriota Cris ‘Cyborg’, então soberana da classe de peso mais pesada, em dezembro de 2018. Nas duas apresentações subsequentes, ‘A Leoa’, como é conhecida, enfrentou e superou desafiantes ao seu reinado no peso-galo.